Perspectiva da vítima deve ser considerada em estupro de vulnerável

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O crime de estupro de vulnerável não traz em sua descrição qualquer tipo de ameaça ou violência, ainda que presumida. Apenas determina que o menor de 14 anos não tem capacidade de consentir com o ato sexual. Neste contexto, é imperativo analisar detidamente as particularidades do caso concreto, não apenas pela perspectiva do autor, mas também da vítima do crime. 

Para o TJ-SC, percepção da vítima deve ser considerada em estupro de vulnerável
Divulgação/TJ-SC

Esse foi o entendimento do 2º Grupo de Direito Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina para, por maioria, acolher embargos infringentes e absolver um homem acusado de estupro de vulnerável. 

No processo em questão, um homem maior de idade foi condenado à pena de 13 anos de prisão em regime fechado por ter se relacionado sexualmente com uma jovem de 13 anos de idade. Inconformado, o réu e o Ministério Público apresentaram recurso requerendo, ambos, a absolvição por atipicidade da conduta. 

A 4ª Câmara Criminal do TJ-SC rejeitou, por maioria, o recurso defensivo e posteriormente os embargos de declaração. O réu opôs embargos infringentes pedindo que o voto vencido prevalecesse, com erro de proibição. 

Nos embargos, o réu narrou que vive uma união estável com a suposta vítima e que ambos trabalham. Também afirmou que só ficou sabendo da idade da vítima ao pedir sua mão em casamento aos seus pais. 

Ao analisar o caso, o relator, desembargador Roberto Lucas Pacheco, apontou que o magistrado de piso perguntou à vítima se ela havia se sentido, em algum momento, estuprada e ela disse que não. A resposta foi dada quando ela já possuía 15 anos, o que, em tese, permitiria que a vítima compreendesse o significado da ação praticada pelo acusado. 

“Conquanto haja vulnerabilidade da vítima por conta de sua idade, não se pode ignorar o sentimento por ela externado quanto à sua liberdade sexual. Ao que tudo indica, inexiste trauma decorrente do relacionamento amoroso mantido pelo acusado e vítima”, registrou. 

O magistrado também ponderou que eles continuaram o relacionamento e tiveram um filho.

“Um exame acurado das nuances do caso concreto revela que a conduta imputada, embora formalmente típica, não constitui infração penal, haja vista a ausência de relevância social e de efetiva vulneração ao bem jurídico tutelado. De fato, trata-se de dois jovens namorados, cujo relacionamento foi aprovado pelos pais da vítima, sobrevindo um filho e a efetiva constituição de núcleo familiar”, argumentou. 

Na visão do relator, condenar um jovem de 20 anos que não oferece nenhum risco à sociedade ao cumprimento de uma pena de 14 anos de reclusão revela uma completa subversão do Direito Penal, em afronta aos princípios fundamentais mais basilares, em rota de colisão direta com o princípio da dignidade humana.

“Dessa forma, estando a aplicação literal da lei na contramão da justiça, imperativa a prevalência do que é justo, utilizando-se as outras técnicas e formas legítimas de interpretação (hermenêutica constitucional)”, finalizou. 

O réu foi representado pelo advogado Silvano Willian Antunes

Processo 5001418-77.2020.8.24.0086

Fonte: https://www.conjur.com.br/2023-ago-05/perspectiva-vitima-considerada-estupro-vulneravel